quarta-feira, 20 de junho de 2012

Dilma dá as cartas

Dilma dá as cartas  
Presidente exorta o G-20 a apoiar esforço de países europeus em direção ao crescimento e releva a austeridade defendida por Merkel


 (Kleber Sales/CB/D.A.Press)
Los Cabos, México — A presidente Dilma Rousseff pautou a reunião do G-20, o bloco dos 20 países mais ricos do mundo, ao defender que, antes de insistir na austeridade, como tem feito a primeira-ministra alemã, Angela Merkel, os países da Zona do Euro deveriam tomar decisões rápidas para enfrentar suas crises financeiras — sobretudo a dos títulos de dívidas soberanas — e retomar o crescimento econômico por pressões “inexoráveis” do mercado, de setores políticos e de sua própria sociedade. Embora o encontro na cidade mexicana de Los Cabos tenha se encerrado ontem sem ser conclusivo sobre o tema principal da cúpula, Dilma reforçou a intenção de líderes como o presidente socialista francês, François Hollande, e os primeiros-ministros da Itália, Mario Monti, e da Espanha, Mariano Rajoy, além do próprio presidente norte-americano, Barack Obama, de que é preciso retomar rapidamente o crescimento global.

Nelson Rodrigues
Dilma chegou a recorrer ao personagem Sobrenatural de Almeida, do escritor e jornalista Nelson Rodrigues (neste que é o ano do seu centenário) para descrever sua expectativa de que os europeus deem um olé na crise a exemplo dos jogadores do Fluminense. “Existe um personagem, e ele é internacional, que se chama Inexorável da Silveira. As coisas não são do jeito que nós escolhemos. Se (os europeus) vão esperar ou não tomar as medidas, é uma combinação de decisões políticas com reações de mercado e da pressão popular”, afirmou. Em tom firme, Dilma disse que é preciso chamar as situações, em especial as delicadas, pelo seu nome real. E esse nome, enfatizou, é a inexistência de um Estado multinacional como sustentáculo de uma moeda regional, o euro. Na sua avaliação, essa situação impede que o Banco Central Europeu (BCE) empreste dinheiro aos países da região.

A presidente demonstrou total sintonia com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e os EUA ao sugerir a necessidade de a Europa aprofundar sua integração, por meio da construção da unificação fiscal — portanto, também das dívidas soberanas nacionais — e bancária. Compreensiva, a presidente afirmou, porém, que o papel do G-20 não é o de “pontificar” as ações para a Zona do Euro, mas apoiar compromissos, em especial os de crescimento.

Questionada por jornalistas se havia entrado em uma fase “paz e amor”, Dilma reagiu. “Adianta alguma coisa não entender? Sabe o que significa entender? Não é fácil resolver a crise de uma moeda que não tem Estado multinacional por trás. Eu estou pagando o preço de tudo isso e protesto veementemente. Não é que eu seja paz e amor, mas eu também não acho que a minha atitude pode ser a de fazer receitas fáceis para os outros cumprirem.”

Oposição
Dilma insistiu na necessidade urgente de reduzir as exigências de ajuste nas contas públicas aos países europeus mais endividados para permitir crescimento econômico em curto prazo na região. Reconheceu que as taxas mais rasas de expansão da atividade no Brasil se devem, em parte, à crise na Europa e à fraca recuperação dos Estados Unidos. “Não somos uma ilha. Temos capacidade de resistir. Mas outros países em desenvolvimento não a têm.”

 A primeira-ministra alemã, Angela Merkel, com a qual Dilma se encontrou pela manhã, tem sido intransigente na defesa da austeridade, ainda que isolada na própria Zona do Euro após a derrota do francês Nicolas Sarkozy nas urnas e a ausência do apoio de Christine Lagarde, do Fundo Monetário Internacional (FMI), que ligada a Sarkozy, fazia eco ao pensamento da dama alemã, mas, agora, está mais aberta ao diálogo.

Dilma insistiu que, sem uma aposta firme no crescimento, a crise tende a se agravar. Ela ressaltou ter conhecimento da importância do bloco europeu em consolidar as contas públicas, mas ressaltou que isso precisa ser feito sem impedir a expansão da economia e desafiou os europeus a fazer os gols imaginários do Fluminense de Nelson Rodrigues para o mundo voltar a ter um placar positivo.

» Rodada Doha
     interrompida


A presidente Dilma Rousseff expressou ontem a seus sócios do G-20 a vontade de relançar a Rodada Doha de liberalização comercial da Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2014, bloqueada pela questão dos subsídios agrícolas dos países ricos. “Não aceitamos prorrogar por prorrogar”, disse Dilma, em Los Cabos, no México, antes de regressar ao Rio de Janeiro, onde participa da Rio+20. Segundo ela, muitos países compartilham dessa posição sobre 2014 como data-limite para que sejam estabelecidas novas negociações. O contencioso agrícola, decorrente dos subsídios que países ricos dão aos produtos, é o principal ponto de discórdia com os países emergentes que produzem grãos a custos menores e querem conquistar novos mercados, a exemplo do Brasil.

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